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sábado, 13 de junho de 2015

QUANTO MAIS CARO.....MELHOR


Já não moro em Alba, mas o fantástico panorama de doces colinas cobertas por vinhedos sem fim, sua gastronomia e sua gente hospitaleira, justificam   minhas frequentes visitas à região.

 
 
Um aperitivo, em um dos incontáveis bares do território, onde é possível beber uma taça e escolher entre centenas de etiquetas, um almoço ou jantar em um dos 400 restaurantes da região, visitar as vinícolas para comprar, diretamente do produtor, os ótimos vinhos locais e, finalmente, mas não menos importante, rever amigos.

Em um dos meus “retornos” resolvi passar na enoteca de meus velhos conhecido Marco e Carlo (nomes fictícios pois a matéria não é exatamente cor-de-rosa).

Fui recebido, como de costume, com festa e alegria.... Longos papos.

Enquanto falávamos de vinhos, nosso assunto predileto, um cliente entrou na loja.

“Bom dia, gostaria de comprar algumas garrafas de um bom vinho e barato. Não quero gastar muito...”

Marco, com ar de enfado e compaixão, se aproximou do sujeito e disparou: “O senhor entrou na loja errada! Aqui vendemos, somente, vinhos caros”.

O já “ex-cliente”, esbugalhou os olhos, balbuciou algumas palavras sem nexo, se dirigiu até a porta e saiu quase correndo.
 

Estupefato, petrificado, com o que acabara de presenciar, não me contive: Você enlouqueceu? É assim que trata os clientes? ”

“Bacco, eu não tenho mais saco, não quero perder meia hora para vender três garrafas de 20 Euros...Dê uma olhada; você já reparou nas etiquetas da loja? ”

Frequento a enoteca dos amigos há anos, mas confesso que não me dei contas das constantes e sutis mutações: Mais de 90% das garrafas expostas ostentavam etiquetas carimbadas. Etiquetas repletas de pontos parkerianos ou winespectatorianos, cheias de bicchieri e mais bicchieri Gambero Rosso, incontáveis decimais da guida dei vini d’Itália e mais um sem-número de outras arapucas editadas especialmente para enófilos zumbis.  

Sassicaia, Masseto, Conterno, Gaja, Ornellaia, Giacosa, Quintarelli, Dal Forno, Soldera, Biondi-Santi e um monte de outras etiquetas “esfoladoras”, lotavam as prateleiras da loja.

“Vocês não trabalham mais com vinhos “normais”?

“Trabalhamos, somente, com vinhos para turistas russos, chineses, brasileiros, americanos, japoneses, escandinavos e outros de menor importância ”.

“Mas ninguém procura um vinho original, típico, bom custo benefício? Uma boa Barbera, um belo Dolcetto, um Nebbiolo....”

“Bacco você está atrasado, desinformado ...jurássico! O turista não entende de vinho. O turista entende de preço. O turista acha que o vinho só é bom quando é caro, aliás, quanto mais caro melhor. Você faz ideia de quantas garrafas de Amarone Riserva Quintarelli, de Masseto, de Monfortino etc., todos acima DE 500 e Euros, eu despacho todos os meses para o Brasil?

São todos vinhos que não preciso apresentar, argumentar ou gastar saliva para vender.

O cliente entra, olha, consulta o preço. Se o preço estiver dentro da média, compra e sai da loja saltitante, “con il culo in fiamme” (com o rabo ardendo), mas extremamente feliz.
Não faço o mínimo esforço e faturo alto”.

Respirei fundo, tentei argumentar alguma coisa: “Mas até em aqui em Alba há tantos idiotas assim? Idiotas que visitam a terra do Barolo, Barbaresco, Barbera para comprar Sassicaia, Masseto, Ornellaia...? ”

Carlo, quase paternal continuou... “Aqui, na minha loja, vinho barato e bom, não vende. Aqui não se vende vinho! Vendemos preços e etiquetas. Certa vez, já se vão mais de 10 anos, comprei, de um viticultor amigo, algumas caixas de uma tremenda Barbera que ele produzia. Vinho perfeito, honesto, bom preço (havia me custado pouco mais de 7 Euros). Empilhei as caixas no meio da loja, coloquei um cartaz indicando míseros 13 Euros e esperei um tsunami de clientes. Depois de 15 dias não havia vendido uma garrafa sequer. Retirei a Barbera da loja, esperei um final de semana prolongado, refiz a mesma pirâmide, bem na porta, e escrevi no cartaz: “SUPER-PROMOÇAO! BARBERA RESERVA ESPECIAL DE 55 POR 35 EUROS. SÓ HOJE!!!!!!!!” Vendi tudo. O pessoal me perguntava que Barbera era aquela e eu, sem nenhum pudor, inventava um monte de história. Dizia que a Barbera era exclusiva, rara, proveniente de um famoso cru, que só em anos excepcionais era engarrafada. Garantia, até, que na próxima edição da Wine Spectator  sairia com 96 pontos.......

Foi a última vez que comprei vinho bom e barato.  Os turistas querem comprar símbolos, ícones, status, não vinhos. Seguem cegamente guias, revistas, pontuações, bicchieri etc. Quanto mais tonto, mais gasta e eu mais faturo….”

O discurso me arrasou.

Pensativo e perplexo, abracei os amigos e continuei a caminhada.

 Em poucos minutos alcancei o wine-bar “La Sagrestia”, bem atrás da catedral de Alba.

Ainda não refeito, sentei, ordenei uma taça do ótimo Timorasso Derthona do Claudio Mariotto (3,5 Euros) e, já restabelecido, pensei: Se há imbecis que compram terrenos no paraíso é perfeitamente normal que existam idiotas que compram, em Alba, Amarone, com 16 graus de álcool, por 450 euros e bebê-lo no Brasil tropical.

Viva os eno-tontos.

Bacco

 

 

 

 


terça-feira, 9 de junho de 2015

ANTICA CORONA REALE


 


Perdi a conta de quantas vezes ensaiei uma visita ao restaurante “L’Antica Corona Reale”, considerado, por muitos gourmets, o melhor da região.

No final de maio, finalmente, deixei a preguiça de lado e reservei uma mesa para o almoço.

Minha opinião: “L’Antica Corona Reale” é um restaurante que deveria ser meta obrigatória de todos aqueles que apreciam uma excelente mesa.

Entre as muitas razões, além da cozinha, serviço, adega, sofisticação etc. há, também, sua história: “L’Antica Corona Reale” nasceu, há exatos 200 anos (1815) e sempre pertenceu à família Rivalta.

O restaurante, atualmente, sob a batuta do chef Gian Piero Rivalta, consegue a primeira estrela Michelin em 2003 e a segunda em 2009.
 

É difícil acreditar que um restaurante em Cervere, aldeia sem atrativos, totalmente desconhecida, salvo pela excelência de seu alho porrô, fora do centro turístico de Alba, faça sucesso por longos 200 anos, consiga alcançar duas estrelas da famosa guia vermelha e seja uma unanimidade quando o assunto é alta cozinha.

Pois bem, acabei de ingressar na legião de admiradores da “L’Antica Corona Reale” é concordar em apontá-lo como o melhor restaurante da região.

“Bom dia, há uma mesa para hoje? ”

A interlocutora, atenciosa, me informou que, infelizmente, para a noite de sábado, o restaurante estava completo.

“E para o almoço? ”

Minha insistência foi bem-sucedida: a moça confirmou uma mesa para as 13 horas.

Um belo aperitivo em um dos ótimos bares da Piazza Savona, um passeio pela via Maestra, uma parada para bater um papo com meus amigos da enoteca “GV Grandi Vini” e finalmente, deixei Alba e rumei para Cervere.

O “L’Antica Corona Reale” é tão discreto, tão anônimo que, apesar de ter passado duas vezes por ele, tive que mandar o GPS às favas, pegar o telefone e pedir mais informações para encontrá-lo.

Corrigida a rota, finalmente, entrei no restaurante onde uma gentil garçonete me conduziu até minha mesa na varanda.

O local é sóbrio, elegante, refinado, sem ostentação.

A varanda, mais parecida com uma estufa de flores, em compensação, é deslumbrante.

A primavera europeia, quando chega, parece querer se vingar da neblina, gelo, tristeza e explode em cores e flores.

A varanda do “L’Antica Corona Reale” as lindas glicínias, brancas e azuis, fazem festa primaveril ..... Uma alegria.

 

A alegria continua quando a competente sommelier, Maria Teresa, oferece um aperitivo
 “O senhor prefere um Franciacorta Ca’ del Bosco, Cavalleri ou vamos de Champagne? Abri, agora mesmo, uma garrafa de Bollinger, mas posso servir, caso queira, uma taça de Bruno Paillard”

Optei pelo Bolliger que foi servido em taça de cristal e com rara abundância.

 

Para almoçar, após sérias duvidas, optei por
“Ravioli di Gorgonzola con Crema di Mandorle Caramellate” (Ravióli de Gorgonzola com creme de amêndoas caramelizadas)

 “Trippa com Porri di Cervere e Lenticchie di Castelluccio” (Tripa com Alho Porrô e Lentilhas)

“Piccione su Vellutata di Sedano Rapa Noci e Tartufo Nero” (Pombo com creme de salsão, nozes e tartufo preto).

Enquanto esperava os pratos, as garçonetes, em incessante vai-e-vem, me ofereceram quatro amuse bouche de arrepiar.

De tanto arrepiar e para esquentar pedi mais uma taça de Bollinger.....

Deleguei os vinhos à Maria Teresa que foi hábil do começo ao fim.

Para os raviólis sugeriu e serviu uma taça de “Château Guiraud 1er Grand Cru Classé”

O Bollinger continuou acompanhando a tripa e o pombo navegou em um ótimo Barolo Pira 2009.

Enquanto degustava, com calma, os pratos, me perguntava o porquê de minha demora em frequentar a cozinha e adega do “L’Antica Corona Reale”.

A única resposta sincera: BURRICE!

Pedi a conta, me preparei para o pior....Pensei que receberia uma “facada” tipo “Acquavit”

Para quem não sabe, o Acquavit foi um restaurante “pirata” brasiliense, tocado por um dinamarquês, que fechou por não possuir alvará e não pagar impostos e que cobrava preços estratosféricos.  

Os 105 Euros, da conta, foram arredondados e uma nota de cem voou de minha carteira para o cofre de Gian Piero Rivalta.

Grande chef, grande restaurante, grande satisfação...

Bocca

PS. Todos os pratos executados magistralmente, mas a tripa, a simples e barata tripa, me emocionou.

Prato pobre e dos pobres, a tripa, do “L’Antica Corona Reale”, é tão perfeita que voltei no dia seguinte para repetir a dose.

domingo, 7 de junho de 2015

BABANDO


 


Postei, no Face, uma foto de uma Maserati.

Muitas curtidas e comentários me animaram.

Eis, então, algumas fotos que, certamente, deixarão babando aqueles que, como eu, curtem grandes carros.

Passeando por Milano, encontrei uma loja: “Rossocorsa”

A “Rossocorsa” é a maior autorizada, Ferrari e Maserati, da Itália.

Impressionado, com a quantidade de carros expostos, dei uma de milionário, entrei na loja e, me fingindo possível comprador, pesquisei os preços de vários modelos.

Quem gosta de Ferrari e Maserati, não tem programada uma viagem até Maranello para visitar o museu do “Cavallino Rampante” e, quem sabe, consolar a mulher do Pizzolato, pode babar sem problema na “Rossocorsa”.

Enquanto isso....algumas fotos.
Bacco
 

quinta-feira, 4 de junho de 2015

CHARDONNAY ROBERT MONDAVI


 Nunca acreditei, nem por um segundo, naquela pantomina hollywoodiana: “O Julgamento de Paris” (americano adora ser o melhor do mundo em tudo) em que vinhos californianos batem, clamorosamente, em uma degustação às cegas, os primos franceses.

Não vou entrar em detalhes, mas é estranho que, após décadas e décadas, os vinhos californianos continuem frequentando, quase e somente, as mesas americanas enquanto as garrafas francesas “inundam” as taças dos enófilos de todos os cantos do mundo.

Os consumidores são todos imbecis ou os americanos, para variar, picaretaram a degustação?

Tenho minhas convicções: Quando um Chardonnay ou um Pinot Noir, de qualquer canto do mundo, é melhor do que um francês.......é francês.

Tirem as conclusões….
 

Um dos meus sommeliers preferidos, desde sempre, é o Lorenzo Brescia do bar e restaurante “Lord Nelson” de Chiavari.

Estou morando, atualmente, em Santa Margherita, mas continuo frequentando, quase todos os dias, os bares e restaurantes de Chiavari e o “Lord Nelson” é um dos meus endereços preferidos para almoçar ou jantar.

 Um bom espumante, antes da refeição, é o acompanhante ideal enquanto admiro o incomparável panorama que se pode apreciar sentado em uma das mesas da calçada do “Lord Nelson”.

Lorenzo, atento e profundo conhecedor dos gostos e preferências dos clientes, invariavelmente, acerta nas etiquetas que propõe.

Lorenzo nunca me declara o vinho servido.

 Oferece a taça, espera que eu prove e tente acertar a casta, a safra e o produtor.

Com muita frequência acerto a casta (os vinhos que Lorenzo propõe são quase sempre aqueles que mais conheço: Chardonnay, Riesling, Verdicchio, Pigato etc.), mas a coisa se complica quando tento desvendar o produtor e a safra.

Acertar o ano é mais fácil.

 A cor dourada indica que o vinho já não é tão jovem.

 Se o dourado for muito intenso, com um pouco de sorte e malandragem, é possível adivinhar a safra, mas acertar o produtor.......

Resolvi almoçar no “Lord Nelson” e escolhi um cardápio de peixes e frutos do mar.

“Quer tomar um aperitivo antes do almoço? ”

A clássica pergunta, de Lorenzo, antecipava um novo desafio.

“Sim, mas não quero espumante. Gostaria de tomar uma taça do vinho de uma garrafa que você escolher para o almoço”.

Lorenzo concordou, desceu até a adega, procurou uma garrafa interessante e retornou com uma taça de vinho branco.

Branco, ”ma non troppo”....

O vinho, de intensa cor dourada, com lágrimas escorrendo lentamente pelo cristal, denunciava sua idade avançada.

 Levei a taça ao nariz, percebi notas amanteigadas, aromas cítricos e complexidade.

“É um Chardonnay, um bom e importante Chardonnay”, exclamei

Lorenzo, com um sorriso enigmático, respondeu:

“Que é um Chardonnay até minha avó acertaria ....Eu quero saber o ano e a origem”.

Tomei um gole, pensei um pouco, bebi mais um e disparei: “O vinho tem mais de 20 anos e é um Meursault”.

Lorenzo foi até o bar voltou com a garrafa.
 

“O ano é 1991! Ponto para você, mas o Chardonnay é americano produzido por “Robert Mondavi” no 25° aniversário da vinícola”.

Olhei com cuidado a garrafa, notei que era importada por Angelo Gaja.

 O vinho californiano quase anulou o ceticismo que nutro pelos vinhos americanos.

Aos poucos o vinho foi se abrindo, evoluído, mas pude notar que as notas amanteigadas continuavam muito intensas dominando e quase cobrindo outros aromas.
 

A mesma sensação podia ser, facilmente, percebida na boca.

Um bom vinho, opulento, intenso, boa estrutura, mas sem a fineza e a elegância dos seus primos franceses.

O preço, 95 Euros nas lojas, mais um ponto contra o Chardonnay do Mondavi.

 Gastando o mesmo, prefiro comprar um Bâtard Montrachet do Paul Pernot, muito mais elegante, refinado e complexo.

Se o Chardonnay, do Robert Mondavi, custasse  menos da metade, certamente, compraria

Para encerrar: Um Chardonnay da Califórnia, em 1976, “ganhou” o famoso “Desafio de Paris”

Será?

Bebi algumas vezes o “Château Montelena” e não me pareceu superior ao bom Chardonnay do Moldavi que, por sua vez, não pode competir com os grandes Puligny, Chassagne, Charlemagne.

O “Desafio de Paris”, para mim, foi mais uma “americanada” como aquela em que o Rambo-Stallone resolve, sozinho, uma guerra.
 

Bacco