Facebook


Pesquisar no blog

quinta-feira, 31 de julho de 2014

MERLOTONE



Recebemos o comentário abaixo

1.    AWESOMO 400028 de julho de 2014 17:27

Nao sei como alguem do seu nivel cultural tem paciencia para ler as asneiras que sao escritas pelos salames e camomilas ai fora.

Os sommerdiers em grande parte dos restaurantes nacionais refletem bem o nivel de conhecimento dos consumidores e vice-versa. E sinto que esse ciclo nao tem fim.

Em suprema maioria ambos jamais viram um parreiral. Me acusaram uma vez de querer confundir ou complicar coisas afinal quem tinha que entender de uva e parreiras sao enologos enquanto que sommerdiers deveriam focar no servico, no atendimento, na escolha do vinho, disseram me. Ate hoje discordo disso.

Os blogueiros sao um caso para psiquiatra. Gente de baixa autoestima que no mangue etilico que eh o vinho nacional se destacam entre os iguais e assim conseguem uma pequena injecao de serotonina quando notam que 20 pessoas leram o post. Basta dizer qualquer besteira desde que seja positiva sobre uma vinicola ou vinho e comecam a vender patrocinio para importadores desesperados.

Ou entao acham os aromas mais absurdos e incompativeis entre si. Como era o caso do falecido Salame que soube que existiu gracas a voces, pestes.

Alem de anao diplomatico, eu acrescento um pais eno-anao,

 

Agradecemos as palavras elogiosas, mas Awesomo esquece uma coisa: se nos deixarmos de lado todos os Salames, Camomilas, Beatos Salus, Didu Bilus Tetéias da vida, eles tomam conta da informação transformam, sem medo de serem desmascarados, o Brasil dos eno-anões (gostei muito da comparação) no país de eno-imbecis.

Querem uma prova.
 

Leiam a matéria que o Oscarito “Me-Daut-Um-Dinheiro-Aí” escreveu sobre a mais nova picaretagem vinícola nacional.

Oscarito começa elogiando o surgimento do “Merlot Uvas Desidratadas 2009”, apresenta, quase babando, o “jovem enólogo inventor” do Amarone gaúcho.

 Sem esconder o entusiasmo apresenta o “curriculum” do nosso mais novo gênio das vinhas e vinhos gaúchos: O moço estudou na Itália, estagiou no Trentino, voltou para a Serra Gaúcha e já abraçou a política do “engana trouxa” muito em voga e praticada regularmente nas adegas do sul

O vinho?

Ótimo, estupendo e vai além nosso Oscarito:

 “Quem aprecia os Amarones, vai se sentir em casa. A estrutura gigantesca, a textura mastigável, o aconchego dos 16% de álcool, o açúcar residual, as notas de chocolate e de terra, o café e as frutas secas estão todos engarrafados.

O Oscarito se sentiu em casa, acusou uma estrutura gigantesca, mas ao mesmo tempo aconchegante, nos 16º de álcool.

Uma pergunta: Desde quanto 16º de álcool, em um clima como o do Rio, são aconchegantes?
 

16º são uma pancada na moringa (salve Didu!) de qualquer mortal.  No segundo copo, a única coisa aconchegante, que o bebum sonha, é um travesseiro....

 Mas ao mesmo tempo, a personalidade da Merlot dirige o conjunto para mares nunca dantes navegados e a gente perde as referências. A fruta é abusada e toma conta de todas as sensações, acariciando o palato, sem querer nunca mais partir. É um vinho fascinante!

 

O Oscarito, na versão “Camões”, navegando mares nunca dantes navegados, é demais!
 

 É fofo.

Naquele cenário lúdico posso até imaginar o “enfant prodige”, da enologia gaúcha, vagando por entre os convivas e se emocionado com o sucesso e elogios à sua criativa criatura.

Uma pergunta maléfica, um pequeno e insignificante detalhe tinge de cinza o, até então, róseo ambiente:  O novo ícone da incomparável vinicultura nacional custa, ao público, estratosféricos   R$ 290,00!!!!
 

Um convidado, com um mínimo de seriedade, no exato momento da revelação do insultuoso preço, sairia à francesa ou subiria sobre uma cadeira e faria um discurso mandando todos os representantes da vinícola Argentaria à merda.

Seriedade, infelizmente, não é o forte de nossos críticos do setor.

Naquele nefasto momento o que fez o nosso Oscarito ?

Me-Daut-Um-Dinheiro-Ai, não se abalou, enfiou a viola no saco, o dinheiro no bolso e, com seus 16º na cuca, foi dormir embalado pelo álcool e na paz do dever cumprido: Divulguei mais uma sacanagem vinícola.

Pergunta? Nenhuma,

Críticas? Imagine...

Dúvidas? Nunca existiram.

Exatamente neste ponto, caro Awesomo, entra B&B.

A vinícola Argenta-ria  , assim como a Miolo e seu Seis Avesmaria (R$ 202) , a Boscato e seu Anima Mortis (R$ 325), Carraro e seu Plural Nebbiolo (R$ 210), Don Glicerindo e seu Gran Reserva (R$ 240) Pericó e seu Vinhogelado (R$ 220 garrafa de 200ml) , percebeu que há uma significante parcela de imbecis  (um idiota ,na ocasião, comprou 6 garrafas) ,  pronta para jogar dinheiro pela janela e gastar os tubos para obter um dos melhores vinhos do Brasil (grande coisa.....), rival, nacional, do Amarone italiano.

É para muitos uma questão de orgulho patriótico, de poder, de status.
 

 Guardar na adega um vinho gaúcho, que em poucos anos, assim como Pinot Noir do Dani-Narciso-Elle que ridicularizou os primos da Borgonha, assombrará os pobres Amarone do Véneto, é prova de grande conhecimento vinícola (putz).

Salta aos olhos o mesmo e já manjado marketing “engana- trouxas”: Uma degustação exclusiva, poucas garrafas produzidas (será?), vinificação esmerada, vinho de nicho, venda direta, que pode ser suspensa a qualquer momento etc. etc. etc.

As perguntas:

Quem garante que as garrafas do “Merlorone” gaúcho foram realmente 600 e não 6.000, 12.380 ou 14.654?

Não há controle algum!
 

Ninguém sabe a verdade, ninguém tem acesso aos números.

 Acreditar na sinceridade e honestidade dos produtores nacionais é, no mínimo, temerário para não dizer outra coisa....

Não vou falar do Amarone, não é o caso agora, mas quero salientar que é um dos vinhos mais famosos do mundo e é vinificado com as uvas autóctones :Corvina (a mais importante) Molinara e Rondinella.

O Merlot?

O Merlot não passa nem perto das vinícolas de Negrar e Cia., pois não doa resultados comparáveis aos obtidos com a uvas tradicionais mencionadas anteriormente.

Os produtores de Amarone, não tiveram ainda a sorte de conhecer o genial e mágico enólogo da Argenta-ria e continuam vinificando errado e, por isso mesmo, são obrigados a vender barato
 

Veja

Amarone Campo dei Gigli
L’Amarone Campo dei Gigli nasce da uve Corvina grossa e … commercializzazione. Servito tra i 18 ed i 20 gradi, l’Amarone


Scheda del negozio

Prezzo: € 49,19


Produttore: Tenuta Sant'antonio | Annata: 2007 | Formato: 75 cl

Para quem não conhece, o “Campo dei Gigli”, um dos melhores Amarone que o dinheiro pode comprar.

Faça a conta.....

As contas

A uva Merlot “BABO 20”, safra 2013/14, custa R$ 1,70 o quilo.

A Argenta-ria gastou, nos 1.500 kg de Merlot, R$ 2.550.

A Argenta-ria produziu 600 garrafas de “Merlotone” e estabeleceu o preço, de cada unidade, em R$ 290.

600 X R$ 290 = R$ 174.000

E ainda tem gente que se arrisca vendendo drogas....
 
Dionísio

    

 

 

 

segunda-feira, 28 de julho de 2014

A FREISA



Um amigo de B&B, almoçando em Milão, bebeu uma Freisa Kyè da vinícola Vajra .

O leitor, que de bobo não tem nada, gostou do vinho e postou um comentário querendo saber algo mais sobre a casta piemontesa que, por sinal, é pouco conhecida na própria Itália.
 
 

Poderia descrever a Freisa como fazem 99,78% dos eno-bloguieros nacionais: Sem nunca ter bebido uma taça sequer de Freisa acessam a web, copiam, em seus blogs, as informações que todos podem encontrar e posam de supremos conhecedores.

Se fosse, eu, mais um eno-picareta, poderia tranquilamente percorrer o mesmo fácil caminho, copiaria todas as informações e poderia, também, passar como grande conhecedor de vinhos.

Picaretagem não é nossa praia.
 

Ao sermos tachados, pelo Nilson e alguns de seus comparsas gaúchos, de mentirosos e desonestos, devemos sempre ter cuidado, não enveredar pelos caminhos fáceis percorridos por Camila Camomila, Gladson Salame, Didu Bilu Teteia, Luciana “Moby Dick” Freire e tantos outros sommerdiers que escrevem um monte de idiotices.

Os palhaços, acimas mencionados, estranhamente, nunca foram considerados desonestos ou mentirosos pelo Nilson e por nenhum produtor nacional.

Falar da Freisa enche meu coração de alegria.

A Freisa está presente, na minha vida e na minha memória, desde a infância: Foi a primeira e única uva que esmaguei, com os pés.

Esta matéria será dividida em duas etapas para não cansar o leitor.

A primeira parte tratará das minhas lembranças de infância e a segunda abordará a uva e o vinho “Freisa” na sua história, seu passado, futuro, qualidades, vinificação etc.

 MINHA FREISA

Nem todos sabem que, no final dos anos 50, ainda menino, morei com meus avôs no Piemonte.

Os velhos (para mim, naqueles anos quem tinha mais de 40 anos já era velho), eram proprietários de um bar e restaurante em uma aldeia da planície Padana.

A planície Padana é aquela longa faixa de terra, cortada pelo rio Po, que se estende desde os Alpes até o mar Adriático, na proximidade de Veneza, onde o rio deságua.
 

As aldeias da região, circundadas por imenso espelhos d’agua, que serviam para o plantio de arroz, sofriam, no verão, com constantes nuvens de pernilongos que, materializadas, emergiam das aguas e atormentavam, sistematicamente e sem piedade, os moradores até o início do outono.

Quando os insetos abandonavam a região, e os moradores festejavam seu desaparecimento, uma neblina espessa e intransponível substituía os pernilongos e cobria as aldeias como um manto cinzento e silencioso.
 

Não sei se deu para perceber que a “Pianura Padana” não era (continua não sendo), uma das regiões mais alegres e belas da Itália.

Nos dias atuais a monotonia é mais facilmente suportável: Há televisão, internet, facilidade de locomoção…A modernidade amenizou a tristeza.

Nos anos 50 e 60 a televisão engatinhava, o cinema abria aos sábados e domingos, raros bailes.... O bar era a único e machista ponto de encontro e diversão.

Sim, somente os homens os frequentavam.
 

As mulheres permaneciam, em casa rezando e pedindo aos céus que seus maridos voltassem sãos e salvos e, “missão impossível”, sem trocar as pernas.

Na pequena aldeia dos meus avós (3.500 habitantes) 14 bares disputavam os clientes.

Para agradar e conquistar fregueses era preciso ter boa comida e bons vinhos.

Minha avó na cozinha e meu avô no bar eram dois craques.

Do fogão de dona Maria saiam pratos simples, mas fieis à tradição gastronômica local: Bagna Caoda, Carne Crua, Peixe em Carpione, Paniscia, Agnolotti, Escargots com Ervas, Cotechino, Salame della Duja, Vitello Tonnato, Acciughe al Bagnet e uma infinidade de pratos que justificavam a fama das panelas da minha avó.
 

Para acompanhar os condimentados pratos?

Nada melhor e mais apropriado do que os vinhos da casa.

Era aí que entrava em cena o velho Giovanni!

Nos bares, somente quatro vinhos: Barbera, Dolcetto, Freisa e Grignolino, servidos, sempre, nos frascos de 0,250 ml ,0,500 ml e de um litro.
 

Não havia garrafas etiquetadas, nunca.

Quando o cliente não especificava o vinho, a Barbera, rainha absoluta das “Osterie”, era servida automaticamente.

Dolcetto, Freisa e Grignolino, somente quando o pedido era explícito.

Meu avô, como todos os outros concorrentes, comprava os vinhos, já vinificados e prontos, em “damigiane” (garrafões de 54 litros) e ia servido em garrafas.

Quando o estoque atingia o nível mínimo, o velho Giovanni, com seu caminhãozinho, ia até a casa do viticultor para buscar outras damigiane.

Sempre o mesmo produtor, sempre a mesma qualidade

A qualidade era importante: Imagine quão difícil seria conquistar um cliente piemontês oferecendo uma Barbera de baixa qualidade......

Somente uma uva, meu avô, vinificava: FREISA.

Nos últimos dias de setembro o velho Giovanni, subia as colinas do vizinho Monferrato, visitava seus fornecedores tradicionais e comprava os vinhos.

O último viticultor merecia uma visita mais demorada.

 Meu avô percorrias as vinhas de Freisa, verificava a maturação dos cachos, escolhia os filares, encomendava as uvas e, no final do ritual, marcava o dia da entrega.

Não havia falhas: No dia combinado as uvas eram entregues no nosso quintal.
 

Meu avô, eu nunca soube o porquê, teimava em vinificar a Freisa e somente a Freisa

Imediatamente após a entrega, as uvas eram pisadas (eu era um dos “pisadores”) e em seguida o velho Giovanni começava a vinificar sua famosa Freisa.

Famosa, sim!
 
Quem ia, nas noites cinzentas e frias, ao bar La Bocciofila” para jogar cartas com os amigos, comer uma anchova al bagnet ou fumar um “Toscano”, aos berros, para poder ser ouvido naquela tremenda balburdia, invariavelmente, pedia: “Nino, n’autra mesa buta ad Freisa!” (Outra meia garrafa de Freisa)

Bacco



sexta-feira, 25 de julho de 2014

O BAROLO MODERNO


João Ratão, cujo blog é um dos poucos que leio com prazer, no obscuro mundo da eno-crítica brasileira, certa vez comentou uma matéria sobre o Barolo Renato Ratti 2009 (o último Barolo vinificado por Massimo Martinelli naquela vinícola).

João externava, na ocasião, sua preocupação quanto a uma “modernização” forçada que poderia influir, negativamente, na qualidade do grande vinho piemontês.
 
 

Eu poderia responder, mas achei melhor e muito mais apropriada a intervenção de Martinelli, um dos grandes responsáveis pela modificação nas técnicas de vinificação do Barolo.

Martinelli, enólogo competente, sério e respeitado, até na França, gentilmente me apontou o caminho das pedras do Barolo moderno.

A palavra com Massimo Martinelli.   

 

“Corria o ano 1969 eu acabara de regressar da Suíça, depois de 5 anos de treinamento, para ajudar meu tio, Renato Ratti, na grande aventura do vinho no Piemonte.
Tive, naquela oportunidade, a possibilidade de participar de encontros, degustações, promoções que visavam evidenciar vinhos e cozinha de nossas fantásticas colinas.
 
Escutava com atenção os colegas mais velhos e experientes.
O Barolo, em sua complexidade, apresentava sempre evidentes notas de taninos que iriam se atenuar, assim diziam, somente depois de uma década.
Depois das primeiras visitas à Borgonha e Chateauneuf du Pape, acompanhando meu tio, procurávamos entender porque os vinhos daquelas regiões se apresentavam elegantes, quase imediatamente….
Esperar dez anos?
Tudo bem, mas nem todos tinham e tem tempo para esperar.
Algumas coisas ficaram imediatamente claras: Fermentação malolática (que acontecia espontaneamente) deveria ser guiada e vigiada.
 
Tempos de fermentação mais curtos.
Maturação em madeira por dois anos (conforme o disciplinar).
Colocando em prática as novas técnicas e obtivemos vinhos de maior elegância particularmente para o Barolo.
As extraordinárias safras de 1970 e 1971 facilitaram nossas observações: Com aquelas uvas excepcionais era quase impossível errar.
Em 1972 um verdadeiro desastre.
Os produtores, reunidos no Castello di Grinzane decidiram rebaixar Barolo e Barbaresco para simples Nebbiolo.
Depois de um verão normal, a partir de 5 de setembro, choveu todos os dias até o final do mês, fenômeno que acarretou resultados incrivelmente negativos: Pouca cor, pouco álcool, estrutura leve!!! 
O passo sucessivo veio com a introdução, na adega, dos tanques de inox: Um material de fácil limpeza, fácil manejo, especialmente para o controle da temperatura de fermentação, anteriormente confiada ao acaso.
 
 
Estas modificações técnicas foram muito importantes para a consolidação e penetração de nossos grandes vinhos nos mercados mundiais: Sucesso que continua, ainda hoje, graças a um conhecimento, sempre maior, das técnicas e ciências.
Massimo Martinelli


quarta-feira, 23 de julho de 2014

BAROLO AURELIO SETTIMO



Conheci o vitivinicultor, Aurelio Settimo, nos anos 90.

Percorria a bela e tortuosa estrada, que de La Morra desce até o distrito “L’Annunziata”, para encontrar Massimo Martinelli na sede da Renato Ratti.
 
 
 
 
 

Já havia percorrido, incontáveis vezes, aquele percurso circundado por esplendidas vinhas e que sempre me emociona.

Uma curva estreita esconde a placa da vinícola Aurelio Settimo, mas não o suficiente para ignorá-la.

Com um pouco de folga no horário (Martinelli é “britânico”) resolvi conhecer os vinhos do Settimo.

Sem hora marcada, sem pré-aviso, na maior cara de pau, entrei no quintal da propriedade, desci do carro e esperei o atendimento que não demorou nem dois minutos.

O dia era chuvoso e eu sabia que os viticultores não estariam trabalhando, assim, Aurelio Settimo me atendeu pessoalmente.

Afável, sorridente, olhos vivos, mãos calejadas: Um verdadeiro homem das vinhas…...e dos vinhos.
 
 

Degustamos algumas taças, de garrafas já abertas, conversamos sobre amenidades e me despedi após comprar 6 Barolo Rocche.

Antes de partir, Aurelio confidenciou: “Consegui um importador e antes do final do ano meus vinhos estarão no mercado brasileiro.

Parabenizei o viticultor, entrei no carro, agora um pouco mais pesado e fui almoçar com Martinelli.

Um belo dia, já de volta ao Brasil, encontrei, nas gôndolas do Carrefour, os vinhos do Aurelio Settimo.

Os preços promocionais, na ocasião, anunciavam o Barolo do Aurelio Settimo mais barato do que o “Ta-lento-Quase-Parando” da Salton.
 

Sem pensar duas vezes comprei algumas garrafas e comentei o fato em uma mateira no antigo B&B.

Os anos voaram, Aurelio morreu e seus vinhos sumiram das prateleiras do Carrefour.

A história se repete.... 

No começo de 2014, percorrendo a mesma estrada, antes de terminar a mesma curva, um súbito impulso: “Vou comprar algumas garrafas de Barolo do Aurelio Settimo”.

Uma rápida freada, uma endireitada no volante, outra vez sem agendar, com muita cara de pau, estacionei no quintal da vinícola Aurelio Settimo.

Ninguém me atendeu.

Uma placa indicava o escritório.

Sem mais delonga e resoluto entrei na sala e perguntei se alguém poderia me atender.

Olhares desconfiados, interrogativos.
 

Uma mulher, beirando o cinquenta, levantou de sua cadeira, veio em minha direção lentamente e sem entusiasmo me guiou até a sala de degustação.

A desconfiança e a má vontade, da minha acompanhante, evaporaram quando pedi desculpa e justifiquei o não agendamento da visita porque havia chegado naquele dia    do Brasil (como os italianos sorriem felizes, quando falo do Brasil. É inacreditável o quanto os italianos adoram o Brasil).

 Era uma mentira, mas colou e Tiziana Settimo, filha de Aurelio, a partir daquele momento me atendeu como um príncipe....
 

Tiziana manobrando freneticamente o saca-rolhas, abria garrafas e mais garrafas, enquanto comentava os vinhos que ia derramando em minha taça.

 Em determinado momento, pensando nas dezenas de curvas que ainda deveria enfrentar, tive que dar um basta e pedir uma trégua.

Entre um cálice de Barolo e um de Dolcetto relatei à Tiziana meu encontro com seu falecido pai, falei dos vinhos que havia comprado no Carrefour e perguntei porque não mais os encontrava no Brasil.

“Vou confessar uma coisa: Cansei de tanta burocracia. O Brasil coloca dificuldades, exigências e mais exigências. Selos, etiquetas especiais, guias que nunca acabam..... Cansei! As quantidades exportadas não compensam tanto trabalho e dor de cabeça.   Brasil e México, que é tão complicado quanto, são mercados que não me interessam mais. É muito melhor, mais fácil e rentável exportar para os Estados unidos e Canada”.
 

Com algumas garrafas de Barolo no porta-malas me despedi de Tiziana e com passos apressados, me esforçando para não perder o equilíbrio e a compostura, entrei no carro e fui almoçar na vizinha “Osteria Veglio”.

 

A VINÍCOLA

A história da Aurelio Settimo e parecida com a maior parte das outras de La Morra e região.

Os pais de Aurelio, em 1943, compraram a propriedade optando pela produção de frutas, verduras, criar vacas e animais de pequeno porte (galinhas coelhos, patos...)

Até os anos 50 as uvas produzidas eram   vendidas aos grandes produtores da região e apenas uma pequena parte era vinificada para o uso familiar, parentes e amigos.

Com a morte do pai, Domenico, em 1962, Aurelio, acreditando no enorme potencial vinícola de suas terras, abandonou a criação de animais, aumentou a área de cultivo das parreiras e resolveu se especializar na vitivinicultura.

Nascia, em 1962, a vinícola “AURELIO SETTIMO”.
 

As dificuldades iniciais não foram pequenas e nem poucas: Até 1974 somente 50% das uvas eram vinificadas e a outra metade continuava sendo entregue às grandes vinícolas da região.

A partir de 1974 todas as uvas produzidas passaram a ser vinificadas na propriedade.

Nos pouco mais de 6 hectares, da Aurelio Settimo, somente uvas tintas: Dolcetto e Nebbiolo,

Os vinhos: Dolcetto D’Alba, Langhe Nebbiolo, Barolo e um interessante Rosé.

 

O BAROLO ROCCHE DELL’ANNUNZIATA

 


Os Barolo, provenientes das colinas de La Morra, são considerados, por muitos, os mais “femininos” de todos.

Preconceito bobo e inconsistente.

O “Barolo Rocche dell’Annunziata 2008”, da Aurelio Settimo é prova viva do contrário.

Com sua límpida cor grená, seu aroma intenso, elegante e que lembra flores (violetas em particular), seus taninos presentes, mas não agressivos e a longa permanência na boca, o Rocche dell’Annunziata é um daqueles vinhos que se fazem beber facilmente e que doam uma grande satisfação àqueles que sabem apreciar grandes vinhos.

Pouco mais de 6.000 garrafas do Barolo Rocche dell’Annunziata, produzidas respeitando fielmente a tradição, são comercializadas anualmente.

O preço?

Acompanhei a polemica provocada pelas duas últimas matérias do Dionísio e me sinto quase constrangido em revelar, que um vinho tão complexo, equilibrado e importante, como o Barolo Rocche dell’Annunziata 2008 me custou 28 Euros (R$ 84)

Bacco.

PS. Recados aos eno-patriotas: Se o Merlot da Aurora foi considerado (sabe-se lá por quem) um dos melhores 100 vinhos do mundo, só me resta concluir uma coisa: 
 
 O Barolo da Aurelio Settimo pertence a um outro mundo; o mundo dos críticos sérios.